Chega de promessa de bênção

NÃO DÁ MAIS PARA AGÜENTAR tanta promessa de bênção. Enche ter de ouvir pastores oferecendo os mais ricos votos de felicidade e proteção...

NÃO DÁ MAIS PARA AGÜENTAR tanta promessa de bênção.
Enche ter de ouvir pastores oferecendo os mais ricos votos de
felicidade e proteção divina a cada culto. Ser abençoado tornouse quase uma obsessão evangélica nacional.
Promete-se tanta riqueza, saúde física e felicidade que, pelo
número de campanhas de oração realizadas, o Brasil já deveria ter
melhorado em algum dos índices de qualidade de vida das Na-
ções Unidas, com algum alívio na distribuição de renda ou menos fila nos ambulatórios públicos.
Chega de promessa de bênção. A espiritualidade cristã, com
suas orações, ritos e expectativas, não gira em torno da vontade
de ganhar o benefício celestial. A ênfase dos Evangelhos não se
resume a um só tema. Jesus lembrou a seus primeiros discípulos
que, antes de se preocuparem em salvar a vida, eles precisariam
estar dispostos a perdê-la (Mc 8.35).
A grandeza de uma causa não é determinada pelo que seus
seguidores ganham ao segui-la, mas pelo preço que estão dispostos a pagar por ela.
Chega de promessa de bênção. Os auditórios lotados de
pessoas  ávidas por receber mais favor divino favorecem o
egocentrismo. Quanto mais se promete, mais se quer receber.



Esse caminho não tem fim. O Salmo 106 narra o comportamento
dos judeus no período da sua libertação do cativeiro egípcio.
Depois de sucessivos milagres, o povo parecia não se saciar,
sempre exigindo mais. Esse fascínio pela próxima intervenção
transformou-se em cobiça, e o versículo 15 traz uma dura senten-
ça: “[Deus] concedeu-lhes o que pediram, mas fez definhar-lhes a
alma”.
Chega de promessa de bênção. A Bíblia não pode ser encolhida
a uma caixinha de afirmações otimistas. Para continuar com seu
discurso de caráter prático, a maioria dos pastores só cita textos
tirados do Antigo Testamento e, ainda, do período judaico
anterior ao exílio.

Os sermões que procuram enfatizar bênçãos deixam de lado
os textos contundentes do Novo Testamento em que os cristãos
são convocados a viverem em um mundo cruel e doloroso. Jesus
não tentou dourar a pílula nem encobriu a verdade: “No mundo,
passais por aflições” (Jo 16.33).
Paulo advertiu a Igreja a não se imaginar numa redoma de
prosperidade: “E, tendo anunciado o Evangelho naquela cidade e
feito muito discípulos, voltaram [...] fortalecendo a alma dos discípulos, exortando-os a permanecer firmes na fé; e mostrando
que, através de muitas tribulações, nos importa entrar no reino
de Deus” (At 14.21-22).
Jesus revelou à igreja de Esmirna, no Apocalipse, o teor de sua
missão: “Não temas as coisas que tens de sofrer” (Ap 2.10).
Chega de promessa de bênção. Quem se obriga verbalmente a
dar tudo, se adorado, é o diabo, nunca Deus (Mt 4.9). A
espiritualidade judaico-cristã não se estabelece sobre utilitarismos.
Deus não quer adoração por aquilo que ele dá, mas por quem
ele é.

No livro de Jó, Satanás faz uma acusação gravíssima contra
Deus. Ele tenta incriminar Jeová por só ser amado por seus
filhos mediante suborno: “Porventura Jó debalde teme a
Deus?” (Jó 1.9). A narrativa poética de todo o livro deixa claro
que o Senhor não era amado por suas inúmeras bênçãos sobre a
vida e a família de Jó, que, pobre, ainda pôde exclamar: “Nu saí
do ventre de minha mãe e nu voltarei; o Senhor o deu e o Senhor
o tomou; bendito seja o nome do Senhor!” (Jó 1.21).
Chega de promessa de bênçãos. A virtude cristã que se deve
buscar prioritariamente é a justiça. No Sermão da Montanha, os
que tiverem fome e sede de justiça serão fartos (Mt 5.6). Quando
o cristianismo destaca a promoção da justiça, todas as demais
bênçãos se tornam secundárias (Mt 6.33). Aliás, não existe prega-
ção legitimamente evangélica sem a busca do direito: “O reino de
Deus não é comida, nem bebida, mas justiça e paz e alegria no
Espírito Santo” (Rm 14.17).
Antes de quererem para si a benevolência do Senhor, os
crentes deveriam almejar a promessa de Isaías 61.3: “A fim de
que se chamem carvalhos de justiça, plantados pelo Senhor para a
sua glória”.
A igreja evangélica cresce velozmente no Brasil, mas será que
percebeu todas as implicações do seguir a Cristo?


Trecho do livro " O que os evangélicos "não" falam" de Ricardo Gondim


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